contagem dos dias

"Ensina-nos a contar os nossos dias para que alcancemos coração sábio" (Salmo 90:12)

10 Jul 2009

No teu dia...

Querido João,

Como sabes, comecei a responder tua carta há várias semanas, ela anda sempre comigo, mas não dei conta ainda de terminar. Teu presente já está a caminho, mas obviamenteatrasadíssimo. Espero que me perdoes o mal jeito. Hoje estou num local que me faz lembrar de ti. Tantas pessoas interessantes. Uma universidade diferente, numa cidade diferente. Estou em Milton Keynes, na Open University. Ontem assisti a diversas palestras que quero partilhar contigo daqui a pouco. Hoje foi minha vez de falar. Isso mesmo, me apresentei para um público de sei-la-quantas pessoas. Público variado, entre acadêmicos e pessoas com algum tipo de dificuldades de aprendizagem, que muitos ainda chamam de “deficiências”. Ontem aprendi muito. Hoje aprendi ainda mais.
A primeira palestra foi sobre a historia de vida do Victor. A plaestra foi apresentada pela pesquisadora que vem estudando a biografia do Victor e pelo próprio. Victor ja tem idade avançada e tem “learning disabilities”. A pesquisadora vinha estudando sua história, resgatando fatos, informações sobre a vida desse homeme, que viveu quase toda a sua vida numa instituição para pessoas com problemas mentais. Foi institucionalizado ainda criança e cresceu longe da família. Durante o período em que sua biografia fazia parte de uma pesuisa sobre a história da deficiência, algo inacreditável aocnteceu. Um familiar do Victor, que jamais o conheceu, estava investigando a árvore genealógica da família e descobriu que tinha esse primo distante que ainda estava vivo. Resumindo a longa e emocionante história, Victor estava diante de um grupo grande e diverso, contando sua história, tendo nessa platéia o primo que viajou de outro país só pra vir assitir sua apresentação, junto com um outro primo distante que também o encontrou nesse período. Resumida assim a história parece não ter nada de incomum, mas na realidade, estar li, ouvir a história com todos os detalhes e emoções do momento, foi divino.


Depois disso as palestras variaram entre mais acadêmicas e mais baseadas nos relatos de vidas, mas sempre numa crescente de aprendizado e abertura de mente para cada um ali presente. Na volta para Southampton, eu e minha amiga viemos discutindo tudo o que vivemos naquele dia, e eu meu pensamento estava o dia de hoje, a expectativa de falar para tão grande público na terra dos outros, na língua dos outros e ainda assim, ter de soar confiante como se estivesse em casa. Claro que as histórias de vida que passearam entre nós me ajudaram a me sentir de certo modo parte de algo profundo com todo o grupo que compoe essa plateia, mas sempre resta espaço para insegurança.



Hoje chegamos bem cedinho, e fomos nos misturar ao pessoal que já se abastecia no buffet de recepção. Foi amaravilhoso trocar idéias com alguns dos palestrantes do dia anterior e sentir o clima amigável do dia que se iniciava. A primeira palestra foi de uma outra pesquisa biográfica, sobre alguém que viveu a experência de ter deficiência nos anos 30 em diante. Patrick estava presente, testemunha viva e vibrante, prova cabal de como ser subestimado dificulta a caminhada, mas não impede uma alma brilhante de iluminar o caminho dos outros. Homem de voz grave e possante, encheu o ambiente com sua alegria contagiante, da mesma forma que nos cativou em sua revolta contra o duro passado. João, não imaginas o quanto eu adoraria que estivesses ali. Das tantas coisas que já conversamos, eu via muitos dos nossos temas ali, accontecendo diante dos meus olhos!

Enfim, depois de outra palestra, chegou o momento que tanto esperei. Amei a experiência e mais ainda a possibilidade de conversar com tantas pessoas interessantes, que me procuraram durante o intervalo do cafezinho e do almoco.
De todas as pesquisas e biografias apresentadas, a que mais mexeu comigo foi a história do Daniel, mas essa vou deixar pra te contar numa conversa.

Findo esse dia, volto-me pra esta tua cartinha. Não aquela que espera um dia pegar um avião e desembarcar no Brasil levando consigo algo mais que palavras que se leem numa tela de computador, mas esta que instantaneamente te alcança sem te tocar. A outra é feita de palavras, cuja essência é a mesma, mas que se podem carregar na mochila pra todo canto e ler e reler sempre que der vontade. Ter a letra manuscrita da outra pessoa faz muito mais sentido, torna tudo mais humano e real. A tua carta tem sido assim pra mim. Espero que a minha também tenha esse efeito em ti (quando a coitada finalmente for terminada e ganhar bilhete de ida).


No teu dia, vivi algo inesquecível e queria muito dividir isso contigo.

Feliz aniversário, meu grande amigo!

No comments: